Seichele Barboza combina sabores e saberes de sua região para criar experiências inesquecíveis

Seichele Barboza combina sabores e saberes de sua região para criar experiências inesquecíveis
Divulgação, via Observatório da TV

Diretamente de Aracaju, está Seichele Barboza. A presença da gastronomia em sua vida veio de sua mãe, certamente uma cozinheira nata, com grande habilidade e conhecimento das técnicas. “Por mais que eu pensasse que não estava prestando atenção, eu estava. Automaticamente fui aprendendo sem nem perceber”, afirma.

Mas, apesar da grande influência materna, Seichele lembra pensar que não tinha jeito para a coisa. Ao colocar a mão na massa, seus preparos davam errado, ficavam ruins, e sua mãe reconhecia que a comida não estava saborosa. 

Seguiu para outra carreira. Aos 18 anos, começou a trabalhar em um escritório imobiliário. Mexia com empréstimos, administrava aluguéis, trocas e imóveis. Nada de gastronomia profissional. Entretanto, tudo mudou quando, aos 21 anos, descobriu que tinha pressão alta. “Foi um choque muito grande. Eu precisava tomar remédio para o resto da vida”, conta.

Com a grande reviravolta, seu médico questionou com o que ela trabalhava, e perguntou se era isso mesmo que ela buscava para sua vida. “Eu dizia que não gostava e não queria continuar com isso”.

Seguiu para o caminho do teatro. De fato, chegou até a estrear a peça “O Corcunda de Notre Dame” em sua cidade. “Eu vi que era muito agradável, mas não tinha muita rentabilidade”. Passou a refletir sobre seus talentos e interesses. “Meu ex namorado dizia que eu cozinhava bem, mas eu não acreditava muito nisso, porque minha mãe dizia que não”.

Mesmo que não pensasse em fazer uma faculdade na área de gastronomia, decidiu aventurar-se quando surgiu a oportunidade de fazer uma aula no curso da Universidade de Tiradentes, em Sergipe. “Foi um aluno que deu a aula, ele estava terminando o curso e me mostrou uma versatilidade, uma possibilidade de criação, amor à comida, que eu disse: é isso que eu quero fazer da minha vida”, relembra. 

Embora não tivesse o dinheiro necessário para fazer o curso na faculdade particular, matriculou-se no curso, e começou a trabalhar logo nos primeiros meses em um grande buffet e como garçonete. Paralelamente, fez cursos de confeitaria e salgado, sempre buscando novos conhecimentos. Não conseguiu terminar a faculdade, mas os seis meses que frequentou as aulas foram o suficiente para lhe ensinar a base da profissão. 

“Depois eu comecei a fazer os meus eventos, pequenas festas, churrascos, alguns casamentos, mas ainda não me identificava, eu tinha sede de aprendizado”. Entrou novamente no curso de gastronomia, desta vez em outra faculdade, e formou-se aos 25 anos. Apesar de agora formada, continuava estudando e profissionalizando-se na área. Muitos livros, cursos e viagens pelo país, incrementando seu paladar.

Enfrentou, como em qualquer profissão, dificuldades para ingressar no meio. “A gente não foi criado para ser empreendedor, mas sim empregado. Entender-se como poder é difícil”. Um grande fator que a ajudou a seguir em frente foi sua crença budista. “Uma das coisas que me norteiam até hoje é a minha religião. O budismo tem uma filosofia de transformação, de que através dos nossos sonhos a gente pode transformar o mundo, que é possível e pode ser feito diferente. Isso me fez querer ir mais além”, explica.

Destaca também a questão financeira e falta de oportunidade como grandes obstáculos para deslanchar sua carreira. “Ser mulher, ser baixinha, ser nordestina é um agravante muito grande. Não ter viajado para fora do país, não falar inglês, o pessoal dificulta o seu acesso, mas tem que levantar a cabeça e seguir”.

E como lidou com a fala de sua mãe quando dizia que ela não sabia cozinhar? Depois do diagnóstico médico, Seichele voltou-se para si mesma, refletindo sobre quem era, sua família e observando o lugar em que vivia. “Comecei a tentar ver quem era a minha mãe e onde estávamos imersos. Entendi que eu não era ruim, mas que minha mãe era muito boa, com uma técnica arraigada no conceito de origem. Então tudo que fugia daquele conceito ela não achava tão bom assim”, conclui.

Desenvolveu uma cozinha contemporânea, abrangendo o fusion food, comfort food e os princípios do slow food. Muito criativa e colaborativa, com o amor pela criação e reinvenção constante. “Se eu não tenho a inovação eu vou murchando, então minha cozinha é muito alegre, eu quero transmitir felicidade e amor através do alimento”.

Em 2019, Seichele foi convidada pela Tv Globo a participar do reality gastronômico Mestre do Sabor. Não venceu a competição, mas mostrou para todo o país seus talentos e competência dentro da cozinha. “Eu tive uma faculdade de uma vida em um curto período de tempo”. Em meio a pessoas com um uma história de 15, 20 anos de cozinha, ela se destacou na disputa, e conquistou uma multidão de admiradores de seu trabalho.

“Eu tinha o grande sonho de mostrar Sergipe para o mundo, mas não sabia como, e consegui fazer pela gastronomia”. Por esse motivo, ela inaugurou o bistrô Seu Sergipe, em Aracaju. “Eu pensei que seria muito bom para o turismo, para quem vinha ao Estado, mas o sergipano busca Sergipe, sua própria história e cultura. Isso me dá muita felicidade”.

Valorizando técnicas, sabores e costumes de seu povo, o estabelecimento oferece uma experiência gastronômica completa. Durante a primeira parte da refeição, os clientes são convidados e ficarem de olhos fechados, um momento de parar o tempo, frear o mundo externo e prestar atenção unicamente no paladar e naquele exato instante.”Muitas vezes a gente não consegue degustar, só devorar os alimentos. Por isso, eu paro tudo para mostrar os sabores que Sergipe tem, as possibilidades, lembranças que pode gerar e como é nossa cultura”. Ainda explorando as sensações, muitas vezes ela leva o fogo à mesa para que a própria pessoa possa finalizar seu prato na mesa, em um verdadeiro jogo para que o cliente entenda o alimento e que a comida faz parte de uma construção social.

As receitas fazem grande sucesso entre aqueles que se dispõe a participar da experiência. Sobretudo o crème brûlée de mangaba, carpaccio de cajú, camarão na fogueira à mesa com salsa crioula e farofa de urucum, risoto de queijo coalho e azeite de coentro com lagostim da boca do rio Sergipe e arraia selada na manteiga de garrafa marinada no limão-galego são apenas alguns dos pratos de autoria da chef sergipana.

O processo ocorre naturalmente. “Ter contato com os ingredientes é a minha maior paixão, e aí a cabeça aflora, você quer fazer o mundo inteiro acontecer em suas mãos”. Com criações tão espontâneas e verdadeiras, Seichele considera seus resultados como suas próprias obras de arte, motivo de tanta alegria e realização.

E para o futuro? Aquela vontade de aprender cada vez mais ainda está presente. Estar perto da praia, correr, passear com o cachorro, cozinhar mais e mais, conhecer o mundo, ainda mais Sergipe, fazer uma faculdade fora do país e aprender idiomas…..ufa! Mas tudo no seu processo. “Antes eu tinha muita sede, hoje eu tenho mais paciência, um pouco mais de tesão pelo dia de hoje e o momento presente”.


Instagram: @seichele

Post Anterior: Adoçando Sonhos

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado.